PAISAGENS FORJADAS

    A fase atual do projeto aqui exposto é o reflexo do equacionamento sobre o lugar da paisagem, um dos antigos géneros da História da Pintura, no contexto da produção artística contemporânea, assim como sobre maleabilidade e transitoriedade da imagem na sociedade atual. A recorrência à História da Pintura, por intermédio da paisagem, não propriamente como reativação de um género ou como um posicionamento revivalista, serve apenas como ponto de partida para uma estratégia que pretende explorar as possibilidades de criação de imagens como simulacros da pintura tradicional de paisagem.
    A pintura não pressupõe a representação de uma impressão sobre a paisagem real, mas implica um revisitar da paisagem como dado histórico e reivindica o seu reposicionamento como construção, de modo que já não é a imagem da representação, mas a representação da imagem de si mesma. A paisagem na pintura passa a ser um universo indireto.

SÉRIE PAISAGENS LÍQUIDAS

    Existe uma forte intenção de explorar as potencialidades da pintura nos seus aspetos sensíveis - mais do que fazer desta um veículo da representação - manipulando a sua materialidade ao máximo e tirando partido das infinitas possibilidades deste meio através da manipulação de inúmeros efeitos com a tinta líquida e com instrumentos diversos.
    Há também uma forma de fazer que exige uma gestualidade bastante exacerbada, onde a possibilidade de corrigir ou voltar atrás é quase nula e onde alguns efeitos resultantes do «acaso» são intencionalmente provocados.

SÉRIE ESTREITO

    A obra Estreito é constituída por alguns desenhos onde se explora a ideia de extrema verticalidade. Tais desenhos podem atuar como ressonância ou sombra de elementos da arquitetura onde estão instalados, como as três colunas da Sala Pequena do Museu da Universidade de Múrcia, dando vida a espaços que normalmente não são valorizados.
    O título faz referência ao lugar geográfico que conhecemos, os estreitos, mas também a um formato pouco comum na representação da paisagem (muito estreito e alto) que requer uma execução de cima para baixo, como quem escreve um texto
Estas «pseudo-paisagens» são interrompidas por pequenos espaços vazos, de forma mais ou menos retangular, que interferem na imagem como elementos dissonantes e perturbadores.

AUTO-CÓPIA

    «Autocópia» é a consequência de exercícios conceptuais em que a cópia repetitiva da própria obra desilude porque, mais uma vez, pressupõe à partida a falha: a impossibilidade de repetir o mesmo como resultado de uma tentativa frustrada de falsificar um original. O prazer acontece mesmo ao não conseguir exatamente a imagem aspirada, mas uma aproximação, uma falsificação.

HORIZONTE

    Uma série de desenhos são alinhados à altura dos olhos do observador. De um lado, o azul puro, do outro desenhos, imagens de paisagens não existentes. Esta série é infinita porque a esta linha poder-se-á acrescentar sempre mais unidades de desenho.

SÉRIE PINTURAS-DESENHOS

    As pinturas-desenhos são construídas não através do contato direto com a natureza, nem sequer através da fotografia, mas a partir de imagens de memória apenas.Tais imagens mentais são descarregadas de forma desconexa na tela, de modo a não haver um encadeamento lógico das partes constituintes destas pseudo-paisagens. Desenhar sobre uma tela previamente pintada com uma imagem também desconexa e plana, mas que remete de qualquer forma para uma certa ideia de paisagem, funciona como um constrangimento propositado porque, através deste desconforto, espera-se que surja outra imagem ainda menos linear ou óbvia. A obra deve acontecer a partir do confronto entre um desenho e uma pintura que nunca se encontram. Esta imagem acontece através da criação e sobreposição de camadas, ora de pintura, ora de desenho, que não têm conexão entre si, numa lógica paralela à acumulação de layers dos programas de edição de imagens digitais.
    Cria-se, assim, um ambiente em que o olhar é lançado para a superfície, porque uma última camada de cor planifica a superfície que pinta, mas ao mesmo tempo para o interior, onde encontramos a primeira camada de pintura, assim como para alguma simulação de profundidade que o desenho provoca em alguns pontos da tela. Desta forma, o olhar do expectador assemelha-se à lente de uma câmera fotográfica que procura o foco sem nunca focar. São pinturas/desenhos que apresentam um carácter fragmentado e sem continuidade interna, visto que são construídas por uma espécie de corte e colagem de imagens retiradas da memória; estas surgem como flashes dispersos que são agregados na tela. Promove-se, assim, a imagem de paisagem como algo artificialmente manipulado e construído.
    A associação de materiais, a princípio específicos de cada um destes meios (pintura e desenho), dá origem a um confronto dinâmico entre dois níveis que não se anulam, mas, no conjunto, oferecem uma imagem que funciona como um todo, embora sempre duplo, dúbio e ambíguo.

SÉRIE INTERGRAFIA

    Insinuações de espaços orgânicos e ou naturais são sugeridos através das manchas e linhas criadas pelo confronto entre os meios líquidos e os meios secos. São desenhos de uma franqueza desconcertante, de uma simplicidade eficaz e certeira, em que não há lugar a hesitações, correções ou fingimento.

AUTO-ESTRADA

   As fotografias da série Auto-estrada resultam da captura de uma realidade em movimento entre pequenos intervalos de tempo. A objetiva é «enganada» porque foca um determinado instante, mas o disparo da câmara acontece algumas frações de segundo depois. Criam-se assim efeitos de focagem e desfocagem que oferecem um olhar inquietante. A paisagem move-se nestas imagens e a fotografia é manipulada como se fosse pintura: a imagem arrasta-se como tinta sobre o suporte, provocando um deslocamento da realidade.
    Todas estas paisagens são atravessadas por uma linha, que rasga as imagens, fazendo um paralelo com outras «linhas» existentes na paisagem que remetem para uma crescente interferência humana sobre a natureza: cabos elétricos, cercas, separadores de estrada.